segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

12.3

É um arroubo de poucas palavras,
de uma expressão pulsante e lúdica,
dizer, assim, sem quaisquer medos,
sem eufemismos ou menções pudicas,

É algo que resume tanto silêncio
e exprime tão pouca angústia
pois, natural e vívido ao sair da garganta,
arranca do peito as contradições mais puras,

os paradoxos mais loucos,
as noites menos memoráveis,
a falta do que fazer, a correria
os fatos, inexoráveis

as imbecilidades cotidianas,
as trivialidades, medidas aos sorrisos e beijos
a certeza da decadência, a incubência
As falsas verdades e os inversos desejos

É um arroubo de três palavras,
que, assim, transformam dores minguantes
em uma pequena e única cusparada
Jovem, ardente, pulsante:

Vão à merda!

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

12.2

- Dedução à parte, sempre imaginei que ias perdê-la em alguma esquina.

- Esvaiu-se da forma que veio, não pude ao menos despedir-me, tocá-la...

- E nunca a tocastes, na verdade!

- Sim, mas pensa bem, é mentira dizer que apenas passou,
ela como que me abandona, aos poucos me tira a liberdade
me arranca os instintos, torna-me um poço de sobriedade
e transforma-nos nesta sina, nesse tal de ciclo que jamais finda
mas, ao mesmo tempo, nos aumenta a idade...
Só sei que, de agora em diante, nada quero,
pois tudo pelo que lutei tornou-se defasado, fútil ou simplesmente errado,
só espero que, agora, ao menos, o tédio transforme-se em paz e tranquilidade!

- É como eu sempre te dizia, amigo,
sempre há a perda de alguns hormônios, pêlos da face, força, energia
mas o que faz do rodamoinho uma vida é essa perda de mocidade.

12.1

Me dizem que há algo de muito honroso
em fazer parte de uma tal minoria consciente:

Não, não serei parte dessa história
e não serei orgulho de mais ninguém
senão deixarei de ver ouro onde há cinza reluzente;

Não deixarei que prepotência finja-se de intelectualidade sóbria
e recomendo que ninguém mais o faça
caso tema o ódio e a inveja conseqüente

E não deixei que toda essa falsidade, essa memória
fizesse sentido a mim, vivo ou em pedaços

Eu não deixarei que vocês desfaçam o estrago
que a (quase?) vida fez em mim.

domingo, 2 de dezembro de 2007

Captions from Belém:

Na rua, passos apertados, cachaça, berros e buzinas
cavalos no trânsito, technobrega ecoando ao fundo
na pista, um homem linchado, ônibus cortando o sinal fechado
Travecos e putas acotovelando-se nas esquinas;

Na praça, maconheiros, traficantes, flanelinhas e camelôs
um posto fechado da polícia, toalhas na grama, "piqueniques"
Coretos mijados e grupos de teatro ensaiando calados
entre pilastras art-nouveau, bares sujos e velhos hippies;

No porto, canoas velhas e velhos barcos,
azedume de peixes, rabada aguada, farinha e pinga
Estivadores, mendigos, aromas e cheiros regionais
Na mansão ao lado, violão e voz, pratos finos e burguesia;

Trinta graus a vinte e cinco, chuva rápida e calor constante
Cinemas fechados, teatros falidos, galpões de pagode e, não obstante,
sãos e loucos dividindo mulheres, homens e mesas de bilhar,
intelectuais e novos-ricos lendo os mesmos manuais amassados
De vivência, educação, cidadania, civilidade - ou não -.
que, acreditem, não deixam de ser ensinados,
e de por ninguém se deixarem ensinar.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

End of childhood

Lembras de quando sentiamo-nos únicos,
e do sangue que corria nos pulsos, outrora vivo,
que agora arrasta-se, hesitante, contra o peito;
Lembras de tudo que sentíamos?

Parecia-nos honroso viver perdidos
entre desejos conexos e idéias errantes,
como se o que nos resta de humanidade
clamasse aos berros, verdades,
que nos levassem a conclusões vis,
jovens, loucas, delirantes:

Garanto-lhes, homens de bem
Quando há um ponto final e muito a recordar
Algo de errado acontece,
e não é desespero, tampouco pesar,

É a certeza de que, antes de hoje,
sempre houve um ontem mais aconchegante.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Dezenove meses de...

Vivências, pequenas, mas não menos importantes
que, de meros retalhos,
tornaram-se pedaços de passos cantantes

Surpresas, essas, sim, digo a ti: tão grandes
lembram, aos poucos, que há cansaço
mas sempre espaço no mundo para novos amantes

Mesmo enquanto haja mormaço
em teus olhos, nos meus
há um azul relutante

E, por ti, sei que amar
Mesmo sem o saber
É escolha sem pesar,
e, entre eu e você,
já tenho muito o que recordar,
embora não precise o fazer,

Pois te amo, e, não obstante,
o clamo.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Ville

Como gostaria de encontrar aquilo
Aquele monte de fumaça e comida fast-food
Aquela gente pálida, perdida,
como que vencida pela correria
Quilos de livros, cadernos e paredes azuis

Sentiria-me vivo ao acordar num susto
Atrasado sem jamais ter saído de casa
E aqueles carros, buzinas e espasmos
de gente berrando, se despedaçando
Sem nem ao menos ter saído do carro

Que ironia, pois aqueles loucos
Deus sabe!, eles sonham com um pouco de paz
Enquanto a gente, que vive enforcado entre árvores, arranha-céus e serpentes
Aguarda a história dar voltas e ver se, pra cá, alguém traz

Modernidade, cultura, vaidade, ruas largas, concreto cinza
Cinemas, bordéis, teatros, céus avermelhados em noites frias
Desespero, pressa, esperteza, correria diária, frieza, razão
Fumaça, fast-food, gente ensandecida, efervescência,
amor e poluição!

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Tout

À vontade, empurrem-se desejos
e verdades, e saudades
e anseios afins:

Não que algo possa ser resolvido ao acaso
Mas, fazendo ou não estrago
não custa nada tentar, sim!

Às mesmas idas, completem-nas vindas
e passeios, ou viagens
aos mesmos lugares, então;

Não que a vida, em si, seja um mercado
Mas, se em meus bolsos há trocados
nada custa gastá-los nas mãos
(ou trocá-los)

Às almas sentidas, a bebida
Aos roucos por natureza, o cigarro
Aos loucos de amor, a comida
Aos heróis de outros dias, o álcool;

Aos fingidos, o sangue-frio
Aos velhos hipócritas, o meio-termo
Às mulheres livres, os abortivos
Aos homens que resistem, o espelho!

Às grandes vaias, o silêncio
À modernidade, a decadência
Aos revoltados, a impunidade
Aos inventores, a delinquência;

Aos loucos por natureza, a rebeldia
Enlatada, como que medida nos berros
Pois o que resta de grandeza na vida
É cachaça embebida em esquinas de versos!

- Às verdades, deixe que tenho-as comigo
elas não ferem, tampouco querem
fazer-se sentidas sozinhas;

Mas, se que faço sozinho, a mim, abrigo
não basta viver uma só mentira,
É preciso existir sem refletir
Inverter as verdades e trocar os ponteiros.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Gerúndio

Há cansaço, e nasce aos poucos,
nas muitas coisas que vou fazendo
- ou arrastando? Que versos loucos...
Não há mais fúria, nem sentimento
Em mim ou nos outros,

Pois somos poucos
dentro de muitos que vão se enchendo
- de tanta merda! Seríamos ela...?
Não há loucura, nem sanidade
Só há remendo
onde outrora vi vaidade.

Pois fomos loucos,
e, entre tantos, fomos crescendo
- à sombra de homens de bem,
Não os perdemos, tampouco tentemos
Esquecê-los

Eles, como meu sangue, minha pele e meus pêlos
São recortes de quem já não está mais aqui
Só há remendos, pequenos espelhos
e hoje só vejo neles pequenas saudades.

sábado, 8 de setembro de 2007

Garota da Cidade Velha


Olha, que coisa mais linda
Doze anos na cara
Cheirando cola na esquina, bebendo cachaça
e a gente que passa desvia o olhar...

Olha que expressão cansada,
Que ar decadente
que roupas rasgadas,
que lar delinquente, que a vida reserva
pra essa moça sem par...

Ah, porque somos mesquinhos,
ah... e a beleza resiste
Mas, por quanto tempo já existe...
Essa gente tão pobre e sofrida,
nos cartões postais tão escondida?

Ah, se ela soubesse que a vida consome
o que resta de humano em todos os homens
e o que resta pra si é viver sem paixão...

Olha que coisa mais linda, ela não é exceção
Desça a Riachuelo,
a General Gurjão
E veja outras mocinhas fingindo passar...

Ah, se as calçadas e as ruas de pedra pudessem falar,
Teriam a vida inteira pra gemer sem calar
da dor dessa menina,
que lá repousa e trabalha sozinha,
e a gente, que só passa, desvia o olhar...

domingo, 2 de setembro de 2007

Pouca poesia

Há pouca poesia e muita prosa neste mundo de deflexões;
Muitas respostas prontas e pouca paciência
Muitos pudores, inocência e falsas incompreensões

Como se um fato, uma verdade, não precedesse a existência
De exageros, adereços e românticas exaltações!

Há uma força doentia que nos implode quaisquer desejos
E nos faz, a cada dia, mais escravos dos sentidos
Como se não bastasse ver-nos iguais no espelho

Como se um pouco de prolixidade não nos tornasse mais vivos!
Lhes afirmo, queridos:
esta é uma era de decadência,
pois o que resta de humanidade e existência
está encerrado na poeira casta dos livros.

sexta-feira, 31 de agosto de 2007

9mm

É hora de novas sintaxes
E - por quê não? - de uma nova mentira
para lhes calar os nobres bicos
Dar-lhes novos lugares a ir, coisas a falar
Me traz um ar heróico de salvar-lhes a vida

Mas quem sabe, quem sabe?,
eu ache que há muito a se fazer
quando, na verdade, o problema não é de ninguém
senão meu mesmo; a decadência

Que todos sentem, mas ninguém vê
É incubência de quem a abomina:
Eu, jamais vocês...

Me dá certo torpor disfórico descobrir
Que a tosca verdade d´aqui já é vivida
Por todo mundo, e o único a sofrer

Sou eu, sempre imbecil
Imerso em uma revolta sem sentido,
preocupado demais com vocês e não comigo;

Não vou calar mais seus nobres bicos,
nem me prolongar, resta só cuspir de uma vez
um sonoro suspiro:
Vão se foder!

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Poema de amor

Se, em mim, pequenina
Fizeste nascer uma força sem limites
Se me fizestes crer no mundo que, em mim, vistes
Estou feliz assim,
Pois sempre fui teu amigo, hoje e sempre

Se enfim, pequenina
O acaso nos fez unir tantas raízes
Se aos poucos, te conheci e me descobristes
Estou feliz assim,
Porque serei teu namorado, hoje e sempre

Porque se és, para mim, pequenina
É pelas virtudes e pela voz rouca
É pela compreensão, pela menção de carinho
Pelos chocolates e curtos abraços tímidos
Pelos esboços de uma vida nova,
Pelas rosas sem espinhos
Que são os minutos de paz contigo no dia-a-dia
Por ti, enfim,
Sou apaixonado, hoje e sempre.

Se por ti, pequenina,
Já cometi pequenas loucuras e grandes ações
Se te fiz menina em versos e canções
Não pense que me finjo homem,
Sou menino contigo, hoje e amanhã

Porque descobri que teu amor é uma honra
E assim, me fizeste sentir a grandeza
Das pequenas coisas, que sempre são as mais belas
E assim o serão, enquanto houver em mim certeza
De que me amas e eu te amo,
Pequenina da minha história, a história mais bela.

(Momento babão. Para Mayara... ^^)

domingo, 5 de agosto de 2007

Trouver

Encontro-me são, preso a um tato que finge-se sóbrio
Mas o é por inércia, e assim, em mim, prende-se
em um vagar solto de idéias divagantes e palavras tangentes
Que escapam ilesas por entre memórias intermitentes
Como se a dor fosse um caminho,
e caminhássemos por ela, óbvios...

A cada taça, a cada garrafa
No décimo cigarro, debaixo da escada
Por trás das janelas fechadas, nos cantos:
Entre lençóis e livros, nos lábios berrando.

Na água, no vinho, no foco do olho mágico
Em decotes, vestidos, ventos frios, no pátio
Na rua, na esquina, na porta do banco:
Entre pensamento e ação, nas mãos abraçando

Teus seios e mágoas, a cor dos lenços na mesa
A ordem dos pratos, o tom amargo da sobremesa
As mentiras lavadas, os pratos quebrados
Os copos cheios na cama, pingando calados.

A cada orgasmo, a cada tropeço
No décimo café sem açúcar, eu vejo
Por trás dos encontros e acasos fingidos
Entre o som e o silêncio, teus gestos exíguos

Te encontro novamente...
Pois embora encontre-me são
Nossos encontros são revoltas silenciosas
de uma paixão já decadente:

No oco, no sólido, no dançar das pequenas horas
No táctil e no subjetivo, desconstruindo outras histórias
Por trás de canções as mais mortas, tua voz ainda ecoa
A cada taça, a cada garrafa, em porres loucos minh´alma voa

E te encontra novamente...
No foco, no borrado, no tilintar do esporro
Nos becos inacabados, nos pontos finais tão poucos
Entre deboches, falácias, melancolia e instinto

Encontrei-te, meu amor, fingindo que não existíamos.

(À poesia)

terça-feira, 24 de julho de 2007

Por trás dos poros

Sempre soei, por trás dos poros, vil demais para ser ouvido por vocês,
mesmo que tudo se resumisse a pequenas e antigas conclusões:

Descubro-me ileso, um homem-abismo, sem eixos,
perdido em uma sucessão de vultosas menções,
rabiscando, nas paredes, lascas perdidas de anseios
e novos caminhos para as mesmas direções.

Tenho, à vista, um cenário propício
para concretizar meu escapismo
por trás de rios de subjetividade:

Dou-lhes desejos, medos, nobres covardias,
individualismos, egocentrismos, porcarias
de introvertismos e tesas irrealidades!

Sempre quis ser, por trás dos poros, mais do que podia por vocês,
mesmo que renegasse o que restava de vivo em minha arte:

Destilo acordes e notas, pequenos versos e trovas,
desafinadas como se fossem naturais:
os mesmos deletérios em dissonâncias novas,
ecoando sozinhos em um resmungo à parte.

Tenho a coragem de muitos e a inocência de poucos,
a dimensão exata da demência,
sei a razão que vês em tanto alarde:

Estes ultrajes qual constrangedores,
ressentimentos e dores imbecilizados
São produtos de uma profusão de desvalores
de um raro inconformismo,
de um amor ao martírio de tenra inutilidade!

domingo, 15 de julho de 2007

Ódio Secular


Só Deus explica qual é o problema
dessas pessoas que empinam os dedos
das mãos, dos pés, os olhos e o queixo
e fingem-se tão sóbrias e cheias de si
Tão óbvias em seus insights frescos!

Comentários certos na hora certa,
olhares lânguidos e palavras sábias;
Vão se foder... vocês, por acaso, imaginam
que a inteligência é coisa inata
E não produto de seu ego pitoresco?

Só eu entendo qual é a graça
de ser errante, previsível, infeliz e contente,
meter os pés pelas mãos e lábios, ou achas
que tanta perfeição é trivial, naturalmente
E não premissa para engolir melhor a si em seco?

Só o Diabo explica, mas ninguém me ouve, então
continuem vocês nessa vidinha de plástico
embebedem-se em rixas e colunismos sem teto ou chão
vou continuar aqui, assim, performático
Um quase apático no seu mundinho de ouro e esterco,
um velho espelho jogado no seu porão.

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Insight

You stand in silence,
swept into the world you´ve created
By means of hatred and violence,
It´s no surprise you´re so disgraced

You hear them weeping
Their nails thumbing to the walls
And no one´s hearing, no one´s giving
A damn to one who crawls...

Behind you,
It´s just the same way you play
Driving insane from day to day...

You gaze to dark skies
Wiping tears off your whitened face
There´s a silence that cries
Between lines of unwritten space

Your heart´s still beating, though;
Who is this child you see on the mirror?
And no one´s seeing, no one´s listening
A damn word that you said so clear...

Before you do,
they´re all losing their grip
Driving insane from day to day...

You stand in silence,
and hear they sliding through the room
The more you´re silent
The more you hear them step on you;

You hear their thumbing nails on the door
You hear them asking for some more
Then you let go the devil in you.

El Club Silencio

Cale a boca,
e entre sem pudores,
esqueça dos rumores,
sinta-se à vontade;

Deixe,
fazerem-se inverdades,
de tantas vergonhas e sobriedades,
não finja estar sadio;

Não finja ser covarde,
já que os homens de bem, coitados,
não passam de marionetes de alma pura
A nós, meu caro
fica o papel de transformar o submundo
Em um antro de demência e luxúria:

Mande-os à merda, enfim
E junte-se aos demônios da sociedade.

Goze,
de tanto esforço e decência,
de toda a resignação e insistência
dos filantropos e intelectuais;

Cuspa,
na cara de todos,
deixe-os emocionar os frouxos
com suas propostas e guerras sociais

Pois este baixio de loucos
já tem homens de bem aos montes
e nada faz pelos que se assumem errantes;
Sempre, sempre, a mesma merda
reclamam dos cantos imundos
mas, o que fazem, além de postulados arrogantes?

Nada!
Mande-os à merda por mim,
pois tenho muito o que fazer na incubência de cuspir verdades.

domingo, 1 de julho de 2007

SP

Ah!
Há traços azuis por trás de tantas curvas cinzentas
Nas esquinas e becos, várias vozes e cantigas
Ecoando; Descansando sob o ar frágil e seco
Estão mil anos de devaneios urbanos
Por trás de olhos os quais vejo
na correria repousando
Um ar de amor ao desespero
e de torpor a ser humano.

E tantos tragam a luz do sol do meio-dia
Com seu hálito fresco e corpo cansado
A fumaça das ruas, vivas e cruas,
estradas de um pulsar ardente
É abrigo para toda essa gente
Que, ao apertar o passo
Se afoga em um ar febril e gelado
Se finge dona de um teatro
que encena e não sente.

Mas ah!
Há beleza em tanta loucura
Na imensidão de som e fúria,
há uma tristeza que não mais se sente;

Há, enfim, poesia na grande cidade,
as rimas renascem em meu peito;
de tuas cinzas, beldades:
Que o asfalto nasça
Viva a arte sem limites desta cidade inconseqüente!

sábado, 16 de junho de 2007

Limiar


- Hoje eu me senti um século mais velho
deitado ao teu lado, sem um pingo de desejo
Entrelaçando os dedos por entre teus seios,
ouvindo teu bocejo
Como se o amor em mim fosse senil,
inimigo de tão simples deletérios;

- E eu, que nunca havia te sentido tão distante
Senti, tão próximo de mim, em vão segredo
tua face, oculta nas entranhas do medo
como se ainda fosse cedo:
Não tenhas pena de mim, meu amor
é tarde demais para revelar-me jovem;

- És, em mim, reflexo dos mesmos anseios
quando pareci cansado, dei-me forças e, imune
Ao teu ardor, lutei, impune
contra as mesmas incertezas...
Acordei suado, meu amor,
de sangue dos meus lábios e lágrimas tuas.

- Vê? Este corpo que renegas neste instante
sentiste gozar, ao som das mesmas músicas cruas
Sentindo o cheiro de cachaça exalar por entre as curvas
das noites iguais, turvas, embriagantes
Como se o amor, para nós, fosse razão de vergonha
confesso amigo dos mais tristes romances;

- E o limiar que nos separa do desejo
é o mesmo que separa tua vida do meu simples toque
é a mesma tormenta que faz com que, a cada dia, esqueça
Os prazeres da morte que tanto almejo.

(Inspirado em Memória de Minhas Putas Tristes, do Gabriel García Márquez)

terça-feira, 12 de junho de 2007

Objetividade


Eu sempre me julguei mais esperto que vocês
Com minhas respostas prontas e bobagens inteligentes
Tais quais cusparadas de mais um jovem demente
Inconsequente, que nada sabe dos outros ou de si

Dentro destes versos, há uma falácia fútil
Criei entrelinhas para que ninguém pudesse lê-las;
Que pretensão!
Logo eu, que mal sei ler o mundo diante de meus olhos
Querendo ter colhões para lhes destilar o ódio
Em palavras difíceis e vagos devaneios

Tão fáceis de seguir,
Fosse o acaso, ao momento, próprio.

Mas eu desvelo o que há de belo no aleatório
Nas mesmas críticas óbvias e detalhes irrelevantes
Que, de tão repetidos em rimas pobres e irritantes
Já me fizeram ter certo prazer em ser prolixo.

Dentro deste homem, há desilusão com a sintaxe
Perdi as rédeas do que há de humano em mim;
Dei as costas para as velhas metalinguagens!
Logo eu, que me julgava pronto para renegar tudo e todos
Parte do mundo que revira o estômago de poucos
E dá sentido à popular felicidade:

Aprendi que, se quero me sentir vivo, preciso, sim
Renegar a mãe dos loucos: subjetividade.

(Poesia derrotista?)

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Free Box

- Liberdade não é libertinagem.
Isso mata meu amor.
Teus dias sempre foram contados,na verdade.
- Eu sei lá,nem lembro de contar quantos dias a mais já tive!
- Isso é sorte.
- Eu chamo de acaso.

- Tua redoma não protege.
Essas noites recostadas na janela são um saco.
- Não joga isso na minha cara!
Eu preciso te dizer isso...se amanhã eu não acordar,
diz que foi sorte.
Que eu já fui tarde.

Ah,como eu te dou trabalho,meu amor.
E é tão bom viver pra crer
Que eu ainda ando com meus próprios pés
Ao mesmo tempo em que me faço um parasita em ti.

- Inocência é não sentir vontade.
Já te disse,estás comprando a dor
Por correspondência,beijo a morte nua em pêlo
- Juro que vou te dizer a verdade...
Faz dias que não me olho no espelho
Por ter medo de encarar tanta decadência

Tanta frescura não me ofende,
Diz se não é tarde demais,deixa estar,então
Fecha essa janela e deixa eu te desenhar na fumaça
O vidro não estilhaça
A porta não abre
As paredes nunca falam
Ninguém sabe,ninguém saberá

Ah,como eu estou aprisionado,só você entende
É tão bom poder te ter
E te perder e te vencer com um dramalhão qualquer
Eu nem mais ando nos meus pés
Eu me arrasto sem saber pra onde vou
Aonde vou cair de vez,só Deus sabe
Só sei que dessa caixinha eu não saio
E só me calo e paro de encher o ar de fumaça quando morrer.

(Arquivo-dos-não-postados-enquanto-a-criatividade-não-vem - Março - 2006)

quarta-feira, 2 de maio de 2007

Prolixo



Acorda, levanta, come, fuma, toma banho, anda,
Rua!

É todo dia a mesma confusão,
rotina cíclica, hipertensão,
e não me venha com mais conselhos!

Chega, senta, lê, escreve, cochila, disfarça,
Pensa, repensa, supõe, argumenta,
E vai pra casa;

Mais um cigarro pra acalmar os sentidos
Mais uma pílula pra reavivar a alma.

12 horas, 13 horas, 13 e meia, 14 horas, 14 e meia,
Rua!

Não adianta fingir organização,
o caos é o mesmo companheiro todo dia:
A insônia, poeirenta paixão!

Senta, conversa, arruma o banco, acende outro,
Chega, senta, lê, escreve, reflete
E, de novo, sai correndo;

Na parada de ônibus, dá prum cochilo
E a Coca-Cola Light faz as vezes do veneno!

Passa o dia com vontade de sumir
por entre linhas e mais linhas de hipertexto;
Depois, chega em casa e sorri
pro yuppie prolixo que vê no espelho.

quinta-feira, 19 de abril de 2007

Póstuma Histeria Decadente

Se um dia fui um poço de inconformismo
Aos berros de asco, lhes provocando a esmo,
E se, assim, lhes mostrei o pouco que vejo,
Peço desculpas a vocês por tamanho egocentrismo.

Já fui menino, e assim sonhei com outros tempos
P´ro mundo dei de ombros: eis o resultado!
Um homem que envelhece numa redoma de aço
Entre livros e cansado, atolado em cigarros e escrevendo.

Aprendi a aprender e estudei a sua história,
Absorvi a metafísica, todas as fórmulas e conceitos;
E se a (cons)ciência nos dá, agora, certo orgulho no peito,
Levantemos então nossos diplomas hipócritas:

Saudemos os pós-doutores
Quanto mais burros, enferrujados e cheios de si,
Mais merecem nosso humilde respeito.

Se envelheci cedo demais, e o que está à minha volta
É prosa de um povo abobalhado, absorto em ideologias,
E se faço parte do coro, dissonante em velhas notas
Peço desculpas a vocês pelo fim do ódio e da histeria.

Aprendi a perder e perdi o rumo dessa história,
Engoli em seco o substrato de mil teorias falidas;
À demência, fica o fardo de guiar a minha vida
Ser assim é perder toda a beleza da retórica:

Enfim, saudemos os velhos amores
Os homens de hoje, de tão burros e cheios de si,
Enterram-se em versos de euforia!

E se a cólera de hoje são as meias-palavras
Vendidas nas esquinas por mendigos e delinqüentes,
Desculpem-me, intelectuais lustrosos e decadentes,
Mas a beleza reside nessas frases soltas e inacabadas:

Há uma poesia natural à vida, que renega o que de bom há
E, por vãmente o renegar, nos faz sentir jovens e ardentes.

(19/04/07 - fazia tempo que não escrevia algo extenso...)

sábado, 14 de abril de 2007

Mal-do-Século


Quando uma paz imensa floresce
em meio à confusão
de dias loucos e sem rumo,
você esquece, que sem direção
nós já somos,
o que nos falta é dar uma chance
ao previsível e ao oportuno.

Assim mesmo, dando de ombros
esqueçamos o quanto somos despreparados
o quanto se sabe do que sabem de nós,
afinal, nada mais vai dar errado
nós já o estamos,
o que nos falta é ligar os pontos
e no reatar dos nós,
descobrimo-nos escravos

De um roteiro em que não temos voz.

* E quando os rumos profissionais parecem estar finalmente se ajeitando, eis que (mais) um imprevisto joga o que vos escreve no emputecimento de praxe.

quarta-feira, 28 de março de 2007

Eu não conheço ninguém,
ao menos imagino não entender
Porque as pessoas que eu conheço
insistam em, fora daqui, me foder

E acenar com um sorriso seco
e ir p´ra casa e nem se lembrar
Como se a rua na qual pisassem
fosse só um caminho a atravessar

Antes do leito modorrento
dos pacotes de fast-food e dos cigarros:

Mas, menino, é tão nojento
ver vocês imersos nesse sonho amargo
de brincar de existir!

Já chega de dados e meias-verdades
assim, eu, ao menos, não consigo fingir
Ser aquele cara andando no seu pátio
pisando na calçada que mandaram construir

Sobre meus palácios, avenidas, calçadas,
desconstruídas e mal-projetadas
Pseudo-vidas, pseudo-redomas, pseudo-mentiras,
pedaços de algo que só cabe a mim sentir

E eu não penso mais em afinidades,
nem em conceitos ou estatísticas
Porque os poucos homens de bem que eu conheço
já as provaram teorias falidas:

Se não os curte, me escute,
está na hora de dar uma saída
Abrir as janelas do seu quarto, quem sabe
abrir as ventanas dos olhos p´ra vida!

Se não mais vive, acredite,
está na hora de calar a boca
Liga o modem, e, em ponto morto,
Marcha pelos zeros e uns rumo à forca!

- Insistem em, fora daqui, me foder.

terça-feira, 13 de março de 2007

Divórcio, Lexotan e Meia-Luz


- Hipocrisias, não... não vai fingir que não previstes!
Hoje é um dia como qualquer outro; os erros, como outros, se repetem,
E, de novo, os papéis aqui se invertem,
E cá estou eu, te contando o que bem sentistes.

- Os anos passaram: a casa, os filhos e tudo o mais
Tornaram-se apenas nós, nos reatando cansados
E, já que a última coisa que nos trazemos é paz
Sejamos ecos e voz de um mundinho forjado!

- E que mundinho esse! Já não sei bem o que sinto;
Se a calmaria arranca o paladar da vida
Então não há graça alguma na paz de espírito
Que é, contigo, dividir a mesma vida.

- Então que se foda! Entrega nosso conforto à risca
Ao mundinho de falácias, papelada e hipocrisia
Os anos passaram: as tuas idéias falidas, jamais,
Me deixa a par de tua aventura desmiolada!

- Nunca me vistes por trás dos mais simples traços
E destes pequenos detalhes que foram passando aos poucos
abriram-se espaços: E cá estamos nós,
dormindo sem nexo, um ao lado do outro.

E se queres ver assim, como se a culpa fosse toda minha
Olha-me desnuda no espelho, e me diz quantos anos eu tinha
Na última vez em que me vistes assim!

(...)

- Já que descansamos tão pouco,
Vire p´ro outro lado da cama, e seu rosto:
Mantenha-o seco e pálido,
Aos hipócritas e falsos, todo limite é pouco;

- E tu, meu amor, durmas descansado,
Hoje não é dia para entregar-me a outros.

sexta-feira, 2 de março de 2007

A Wild Heart

Há uma luta que perdura nas entrelinhas,
e não passa de um vir-a-ser unívoco
Dois personagens em um mesmo discurso
atrelando à toda a deriva um só sentido
E descobrindo-o tão sofrido e fútil.

Como se nós fôssemos corruptos
que traíram a paz dos infelizes
Enxergando a beleza de ter os corpos desnudos
sob os lençóis encardidos do desatino.

Sou o menos belo, bom e útil
que tu possas imaginar:
Sou a carne e o espírito do desperdício
onde vês artifícios para, um dia, amar.

Há uma derrota que já se faz ouvida,
mas prometo, por ti, não a prolongar demais:

Se não me perdoas,
me perdoe, mas meu lugar não é aqui!
Esse ar abafado me perturba os sentidos:
É apenas o vício,
de confiar demais e um pouco menos em ti.

Se não acreditas,
acredite, eu não pertenço nem a mim mesmo!
A pressão me arranca o que resta de espontâneo,
Eu não existo para contradizer instintos,
eu não preciso por inércia ser ouvido:

Só resisto porque não quero existir mesmo!
Não nessa terra de poucos e estranhos amigos
De tão parcas coincidências e tão vastos amores
que, por mim e por ti, se fizeram sentidos.

* Homenagem ao filme de David Lynch, "Coração Selvagem".

sábado, 24 de fevereiro de 2007

Ultraviolence



- Não foi por falta de aviso:
- Viver aqui é não ter amor próprio
Remoer, remoer e remoer seu próprio desfecho
Sob a meia-luz decadente do velório
que é aqui - ou ali - viver.

Veja só, eu nunca fiz mal a ninguém
Um belo dia, acordo e vejo:
Mais mortos ao amanhecer
Mais gente chorando, mais rosas brancas
Mais enterros!

Levam pedaços de si - ou seriam de mim?
Enfim, esses pequenos destroços de memória
em carne viva, que me ferem a retina
são a simples revolta de uma história
resumida na mesma velha sina:

- Estar vivo?

- Sim; e além disso, vivo ser feliz.

* Homenagem à merda de dia que foi hoje, às pessoas que sofreram hoje, às coisas absurdas que aconteceram hoje, à tristesse de só mais um diazinho qualquer.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Depois do Começo


Quando há pequenas coisas,
e elas se tornam feridas,
e elas crescem e nos dominam,
e viram assuntos indiscutíveis;

Quando as mentiras são poucas,
e mais vale calar-se sorrindo,
e a consciência não mais nos poupa
da verdade que perfura os sentidos;

Quando toda crítica é louca,
e todos, menos vocês, estão ouvindo,
e nem mesmo suas lágrimas roucas
são capazes de calar meus gritos;

Quando há grandes fatos,
e, para eles, não há argumentos,
e eles alimentam-se de sangue
tal qual cânticos violentos;

É a hora de cerrar os olhos e fechar a boca,
e estar pronto para seguir seu caminho:
Seja, no meio dele, se perdendo,
seja levando tiros na estrada
que leva um homem ao seu abismo.
* Everything okay with you guys? I´ve been a little too busy to keep writing these days... now i´m back, hope you enjoy... hugs.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Meninas de Família


Meninas de família não gozam
Assim como são virgens,
Passivas, pacatas, inocentes
Suas pernas não se desdobram nunca
- São tão resistentes!
Mas diante da libido ou de um beijo na nuca,
talvez totais inconseqüentes;

Meninas de família são astutas e sensatas
Assim como não bebem:
Nunca as vi caindo nas calçadas...
As palavras que raramente lhes vêm à mente
Gritam pelos poros entorpecidos
tal qual estilhaços de copos caídos
no chão frio de uma noite ardente;

Meninas de família são influenciáveis
Assim como se deleitam sozinhas
não conhecem o sabor de uma loucura feita a dois
pois não podem sentir o gozo cedo:
Tadinhas!
Masturbam-se que nem loucas em seus quartos,
pensando em homens, festas e sexo barato
até caírem no mesmo sono intermitente;

Meninas de família não se drogam
Assim como foram ao cinema aquele dia
Filmes trash, pipoca e chocolate quente;
Suas mães não se esquecem nunca
do dia em que viraram gente
e "pareceram putas,
de tão cheias de vida, com a fumaça entre os dentes";

Meninas de família só se entendem entre si
Assim como sempre se dizem
mal-amadas, esquecidas por famílias ingratas
(e estão certas)
Seu valor se revela às próprias ruas
longe das cláusulas e convenções chulas
- São "vagabundas",
assim como você, ou como eu:

Meninas de família não são freiras,
assim como não são prostitutas.

domingo, 21 de janeiro de 2007

Festa Vazia


Trilhas sonoras, longas, cansativas,
irritantes, tediosas, forçadas,
RIDÍCULAS;

As mesmas músicas, acordes, melodias
dissonâncias, mil discrepâncias: igualmente
RIDÍCULAS.

O mesmo odor, calor, fétido, suor
inebriante, artificial, lisérgico
RIDÍCULO;

Copos, garrafas, vômito, sexo,
idas e vindas ao banheiro:
RIDÍCULAS.

É a mesma dança, morna, débil,
cansada, irritada, deprimente
RIDÍCULA;

Sábado, Domingo, Sexta ou Quinta
meia-noite ou às cinco, sempre serão (f)estas
RIDÍCULAS.

domingo, 14 de janeiro de 2007

Cold


Em um frio subcutâneo,
Quase surreal
Acordo e adormeço ao som das mesmas músicas
E me permito, mais uma vez, tremeluzir;

Em batidas silenciosas
Ininterruptas em novo leito
Que me permitem por, um segundo, sorrir
Até as luzes intermitentes calarem meu peito.

Se há algo crescendo dentro de mim
E, em mim, cultivem o ódio
Que contenham-me todas as convenções
Que sejam meu leito o metal e o asfalto

E não suaves retalhos de um formol tão sólido.

Entre acordes estranhos,
Quase dissonantes
Estejam as melodias desafinadas e ocas
Das nossas canções relutantes;

Em rítmicas sinuosas,
Que nos empurram de volta aos lençóis,
Que um cigarro seja capaz de reatar os nós
Que aprisionam as palavras em meu peito.

Se há um frio assim, inerente
E, em mim, isso seja latente
Que calem-me todas as conclusões
Que o mundo tem a meu respeito.

Que eu seja metade de mim, doente,
Feito de carne e metal, tal qual vocês todos;

E que jamais eu me levante dessa cama novamente
Para ver o sol se pôr em mais um crepúsculo cinzento,
E ter a certeza de que vivo, sim,
Mas a cada dia mais morto.

José Augusto Mendes Lobato 14/01/07

* Uma dica: Ouçam a música homônima dos ingleses do The Cure, vão entender melhor esse poema.

Auto


Ah! A vida,
tão bela, incerta, tão rica em acasos
E, em ocasos, sofrida,
de tão vivida aos pedaços.

Surpresas,
pós-surpresas,
clausura fútil,
ar de auto-asfixia;
Sexo,
auto-sexo,
auto-amor,
auto-orgia!

Vir-a-ser eterno, cansado, melancolia;
amores, pós-amores, ódio e falácia vadia

E, sobre a mesma terra morta,
Pegadas de amores, temas para todas as horas
de mentes otárias absortas em poesia.

Agora me diz: é sempre assim, as novas idéias tuas nascendo
e se sobrepondo às rotas minhas?

Não. Somos nós mesmos, meu amor
tomando por vencidas nossas rédeas soltas.