quarta-feira, 21 de junho de 2006

Memória Auditiva

Lembra do dia em que fumei o primeiro cigarro?
Quase não consegui juntar duas palavras e fazer delas um verso;
Lembra daquele passo torto, daquele olhar vago?
Quase não dei conta de ir para casa, já te peço paciência

E eu tropeço, sempre em inocência
Tal qual uma criança que não olha nunca para os lados
Lembra de todas as primeiras vezes que me destes?
Quase que me construístes, mesmo que inerte!
E transfiro a ti a culpa de toda minha tristeza
E de toda a minha falta de saudade

Quase que me apeguei à liberdade
Antes de me tirares dela com os braços estendidos.

Pois é, eu ainda existo dentro de mim
Embora tudo agora seja uma redoma
Embora tudo continue assim

O mundo feito de palmas e sorrisos
Luzes ofuscantes me cortando os sentidos
O tempo arrastando a fumaça de meus lábios
Os dias engolindo minhas noites em claro
Nossas mãos se apertando e se enforcando em silêncio
A realidade contradizendo as loucuras em que penso
E toda a tristeza de um homem comum ressoando
Nos pátios das cidades que vão, lentas, sufocando

Lembra do dia em que fumei o primeiro cigarro?
Ouvia a música de um bar qualquer penetrando em meus ouvidos
Tal qual um vírus urbano a me infectar os sentidos
Lembra daquele passo torto, daquele olhar vago?
Quase não dei conta de ir para casa,
Dancei e vomitei desfalecido nas escadas!

E, me diz, de que adianta?
Por trás de tanta maturidade a memória, em parte, me alcança
Lembra te todas as vezes que dissestes
Que eu ia me arrepender?
Ah! Se eu soubesse!

Estavam e estão, lado a lado, agora,
Um menino e um homem em sua realeza:
Ambos infelizes, sem história e frustrados

Quase que apagando as pontas de seus cigarros
Nos pulsos cortados por copos jogados à mesa.

José Augusto Mendes Lobato 21/06/06

3 comentários:

Anônimo disse...

Queria saber quais são as tuas "fontes". De onde tu te inspira para escrever tantas coisas ...
;)

Marcelo Ribeiro disse...

Porra. Eu tenho um amigo que me diz que as coisas essenciais da vida são aquelas que, depois de feitas, você não se sente mais o mesmo. Confesso que depois de ter lido este poema, não sou mais o mesmo...

Anônimo disse...

égua primo, fazia tempo que eu não lia teus textos...
e quer saber?
eles continuam perfeitos!!

=**