sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Higher


Acordou suada, com os pés e mãos trêmulos:
Levantou-se, sem ar, saiu correndo,
Abriu a porta do quarto, descobriu-se sozinha,
acendeu um cigarro, olhou pela janela,
Toda aquela gente lá fora,
Vivendo.

Lembrou-se de acender as luzes,
Ligou o computador, a televisão – seu maior alento,
Sentiu-se acompanhada, abraçada pelas imagens
Tateou a tela, riu, sentiu cócegas nos dedos,
A mão, o corpo inteiro, o peito, estavam
ardendo.

Doía-lhe a alma dormir tanto e, por tão pouco,
Não querer acordar:
Há dias sabia-se só e, a princípio, inteira,
Mas o tempo fez ver que uma parte de si
Desistiu, cansou-se, bateu a porta e a deixou ali,
Vazia, abandonada, mal cuidada, abatida:
Quase morta por dentro.

E, assim, de novo, deitou no sofá,
Voltou a apagar as luzes, trancou as portas,
Bebeu, fumou, cheirou noite adentro
Chorou por um filme qualquer, ligou para os pais
Desabafou, gritou, desligou o celular e, então, sentiu-se em paz,
Aquilo que, há horas, tomara para lhe tirar as dores
Agora estava doendo.

Mais uma vez, maltrapilha, dopada,
Deixou-se arrastar até a porta do quarto
Um último olhar para trás; já era madrugada
Toda aquela gente, e ainda mais gente, continuava lá fora,
Calor humano, gritaria, paixão, movimento;
Imagens de cor, imagens de torpor, imagens de vida;
Vai ver ainda tinha sentidos – ou sentimento.

Um comentário:

Anônimo disse...

Perfeito!
"Aquilo que, há horas, tomara para lhe tirar as dores
Agora estava doendo."