1
Foi pelo caminho mais difícil:
Tapou os ouvidos, atravessou o corredor
E toda aquela gente gritando, chamando, olhando torto
Cortando os pulsos com os olhos
Sentiu-se morto
E já que ninguém deu por falta
Sentou-se à esquerda na passarela
Atrapalhando o tráfego
Cobriu os pés, fechou os olhos e se curvou:
Descansou.
2
Do outro lado do viaduto, o fedor do rio:
Vinha com pressa, olhando em volta
Alguém podia notá-la, era tanta gente nas escadas, no ponto,
Os ônibus lotados, o mau cheiro, o calor
Sentia-se seguida, perdida
Mas como estava cansada
Sentou-se no meio fio,
Pegou a pedra, apertou-a, sentiu-se morta,
Revirou os olhos, beijou o céu
Acendeu o fósforo e se largou:
Delirou
– e dormiu.
3
Mais perto do verde, mais frio;
Beijou o rosto no espelho do banheiro, desejou-se um bom dia
Guardou o pouco que tinha no casaco, entre os dedos, no bolso
Sentia o impulso apertando o peito
Cheirou; sentiu-se vivo
Como ninguém o notava, caiu em si
Chorou, compulsivamente e sozinho,
Atravessou, desceu da balsa, avistou a ponte,
Pegou um desvio no caminho, pensou e pensou:
Calou-se
E mergulhou no rio.
4
Na porta da loja, pegava vento
Falando com quem passava, todo sorrisos
A banquinha em mãos, esperava, esperava, esperava
Só de olharem já era um alento
- era visível –
Mas nunca, nenhum dia, alguém comprava
Afinal, era um velho fedido
Um dia cansou, puxou a navalha
Gritou por ajuda – ninguém entendeu, queria atenção
Mas, em vez de ouvir,
Aquela gente ficou assustada
Chamaram o segurança,
Tomou porrada,
Foi parar na delegacia,
Pegaram dele o pouco que restava
De volta à rua, encarou o viaduto
Olhou para o céu, depois para os pés, e pensou:
É hora
E desistiu.
Poesia para Loucos
Sem pretensões, sem referências pseudoliterárias, sem joguetes verbais de grande complexidade, sem autores obscuros de referência, sem nada. Só escrita.
terça-feira, 11 de outubro de 2016
sexta-feira, 1 de abril de 2016
2016
Essa sucessão de ideias soltas
Essas frases de efeito vazias
Essa raiva de tudo que se move
Essa vontade de gritar, cuspir na cara,
Mandar pro inferno – e que nunca volte!
Esse grito guardado
[que vem à tona depois de cuspir no prato]
esse jeitinho pacato
que, lá no fundo, é histeria
tudo falso
tudo bem montado
tudo encenado
monitorado:
demagogia
Essa gente de bem,
Tão sensata e cheia de si,
Parece estar incomodada
Mas – mal sabe – é mobilizada
Sem que se dê conta do que está por trás
Mas insiste em estar aí
Na cara
Essa é a nossa mais nova energia
O que nos move, o que nos intriga
Espumante, babante,
Revolta seletiva e programada
Vazia em meias-palavras
E cheia de covardia
Singularizada:
O problema está numa cara
E uma tremenda gritaria
Esconde os reais motivos
No fim das contas, tudo decidido
Essa vontade de largar tudo,
Essa moral que serve de escudo
É, antes de mais nada,
Fruto de pequenos arroubos seletivos
Essa sucessão de revoltas
Esses projetos, essas ideias já mortas
Essa nuvem que paira à nossa volta
Tudo já esteve por aí
E voltou para nos lembrar
Que pobres de espírito somos
Nunca aprendemos,
Nunca cansamos
Essa é a mais pura demonstração de não afeto
De um desejo mórbido, passado, abjeto
Que, não fosse escuso, não surgiria
Travestido de vontade de guerra
E, mesmo assim, sendo chamado
Cidadania.
Essas frases de efeito vazias
Essa raiva de tudo que se move
Essa vontade de gritar, cuspir na cara,
Mandar pro inferno – e que nunca volte!
Esse grito guardado
[que vem à tona depois de cuspir no prato]
esse jeitinho pacato
que, lá no fundo, é histeria
tudo falso
tudo bem montado
tudo encenado
monitorado:
demagogia
Essa gente de bem,
Tão sensata e cheia de si,
Parece estar incomodada
Mas – mal sabe – é mobilizada
Sem que se dê conta do que está por trás
Mas insiste em estar aí
Na cara
Essa é a nossa mais nova energia
O que nos move, o que nos intriga
Espumante, babante,
Revolta seletiva e programada
Vazia em meias-palavras
E cheia de covardia
Singularizada:
O problema está numa cara
E uma tremenda gritaria
Esconde os reais motivos
No fim das contas, tudo decidido
Essa vontade de largar tudo,
Essa moral que serve de escudo
É, antes de mais nada,
Fruto de pequenos arroubos seletivos
Essa sucessão de revoltas
Esses projetos, essas ideias já mortas
Essa nuvem que paira à nossa volta
Tudo já esteve por aí
E voltou para nos lembrar
Que pobres de espírito somos
Nunca aprendemos,
Nunca cansamos
Essa é a mais pura demonstração de não afeto
De um desejo mórbido, passado, abjeto
Que, não fosse escuso, não surgiria
Travestido de vontade de guerra
E, mesmo assim, sendo chamado
Cidadania.
quarta-feira, 2 de março de 2016
Bárbara
Umas três da manhã
Desceu, de escada e de pijama,
Acendeu um cigarro, descalça passou a portaria
Desceu a ladeira
Bem mais devagar do que de costume
Bem mais feliz do que gostaria
Arrastou a pele contra a garoa fina
Era verão, mas pouco importava:
Não tinha proteção, nem energia,
Chegou ao canal, sentou-se à beira
Viu seu olho vazio espelhado naquela nojeira
Por algum motivo, permanecia inteira
E ali ficou, punindo-se com o fedor
e o frio.
Ninguém entendia,
Parecia louca,
Mas às vezes cansava da segurança;
Às vezes só queria se expor como todo mundo
Há quantas noites ia sentar por ali
Procurando um problema para a sua vida
Sentia um vazio enorme, e tão pesado
- E tão profundo! –,
No entanto, nunca encontrava nada
Para onde olhava, só se via.
No fundo, era isso que a fascinava:
A sensação de que ia, voltava,
Pegava o roteiro de sua vida e amassava
Jogava-se no lixo
Mas tudo permanecia no mesmo estado:
Toda tentativa de dar a volta
dava num caminho ermo e equivocado.
Um dia, então, deu-se conta
Precisava atravessar a ponte, ir até a ponta,
Dividir o chão com aquela gente semimorta
Era hora de ser outra;
Estava pronta.
Largou no chão suas roupas
A bolsa, largou na esquina,
E assim, entregue, absorta,
Entregou-se a si mesma
Naquela noite fria, sentiu-se nua e forte
A manhã nasceu com cheiro de morte
Pra moça de alma rouca
Via-se numa estrada infinita, vazia,
Agora não mais falava;
Só ouvia.
Qualidade
Farsantes e mais farsantes
Andando juntos, cheios de glória
Brincando de viver, brincando de si
Brindando suas próprias conquistas
Tão desproporcionais, irreais
Tão delirantes
Expandem suas conquistas
Coisas pequenas, subitamente, tomam vida
Apagam o que está à volta:
Não satisfeita em se deixar ver
Essa gente se deixa escarnecer,
É sua própria piada
Seu próprio alimento
Sua própria razão de vida.
Essa gente pequena, mas que se engorda
Olha-se no espelho e fica assim, absorta,
No entanto, finge-se de morta
Quando precisa;
E aí convence, e assim se perpetua,
às vezes sem notar,
Sem se fazer percebida.
São como vermes comendo uma fruta na cesta
Sobrevivem de migalha
De vender-se e, sei lá como, gerar encanto
Gentalha – se um dia soubesse imitar
Não seria tão frágil e exposto
Querendo ser só assim
Normal
Quase mediano.
Andando juntos, cheios de glória
Brincando de viver, brincando de si
Brindando suas próprias conquistas
Tão desproporcionais, irreais
Tão delirantes
Expandem suas conquistas
Coisas pequenas, subitamente, tomam vida
Apagam o que está à volta:
Não satisfeita em se deixar ver
Essa gente se deixa escarnecer,
É sua própria piada
Seu próprio alimento
Sua própria razão de vida.
Essa gente pequena, mas que se engorda
Olha-se no espelho e fica assim, absorta,
No entanto, finge-se de morta
Quando precisa;
E aí convence, e assim se perpetua,
às vezes sem notar,
Sem se fazer percebida.
São como vermes comendo uma fruta na cesta
Sobrevivem de migalha
De vender-se e, sei lá como, gerar encanto
Gentalha – se um dia soubesse imitar
Não seria tão frágil e exposto
Querendo ser só assim
Normal
Quase mediano.
Percepção
Acordou, da cama gritou para os pais:
Hoje vai ser um bom dia!
Saiu de casa, rodou, andou, deu voltas,
Encontrou uma gente de cara fechada,
Abraçou quem gostava,
Apertou as mãos, bateu algumas portas
Vendeu-se bem: menina esperta;
Mas, de novo, não ganhou nada.
Voltou pra casa cabisbaixa,
com a sensação de derrota;
chorou um pouco, trancou a porta,
depois voltou à sala,
Disse-lhes novamente:
Amanhã vai ser incrível!
Vou dormir, estou morta.
E assim foi mesmo:
No dia seguinte, estava na rua e viu as luzes ao longe
antes que pudesse dizer qualquer coisa
reconheceu a cara,
o suor, a cara de ódio:
lembrou seu fedor,
lembrou seu nome.
Saiu correndo
Derrubou uns pelo caminho
A bolsa caiu na vala
A chuva caía devagar, cortante
Sentiu-se impotente
Tentou pedir ajuda
Não deu tempo:
sentiu a pontada no peito.
Caiu no chão, devagar
viu-se, então, morrendo
beijando uma poça, virada pra serra
a alma ardendo.
Tão bela, tão exposta
largada na lama, que nem bosta;
fechou os olhos como todas as noites:
com um mundo inteiro gritando
e um monte de gente esperneando
lá dentro de si.
Expectativa
Pra que planejar tanto
Organizar tudo mentalmente
Colocar as coisas no chão
Montar um caminho,
Eleger uma direção
Fingir-se cheio de planos
e estar seguro de si
Se, no final,
É sempre tão diferente,
Se é sempre não viver,
E sim assistir?
Pra que expectativa?
Mover as peças, acender a luz
De repente pensar:
Essa não é a minha vida!,
Se no fim das contas a gente se depara
Com alguma surpresa amarga
E dá meia-volta
E volta de onde partiu:
Se dá conta que nem saiu
Da própria cabeça
e das próprias expectativas
Por que mexer
Nesse mesmo lugar que, vez ou outra,
É ferido
Se no fundo, nada muda,
Só fica o incômodo
A frustração, a dúvida
A sensação de que algo nisso tudo
Nunca fez – nem fará – sentido?
Organizar tudo mentalmente
Colocar as coisas no chão
Montar um caminho,
Eleger uma direção
Fingir-se cheio de planos
e estar seguro de si
Se, no final,
É sempre tão diferente,
Se é sempre não viver,
E sim assistir?
Pra que expectativa?
Mover as peças, acender a luz
De repente pensar:
Essa não é a minha vida!,
Se no fim das contas a gente se depara
Com alguma surpresa amarga
E dá meia-volta
E volta de onde partiu:
Se dá conta que nem saiu
Da própria cabeça
e das próprias expectativas
Por que mexer
Nesse mesmo lugar que, vez ou outra,
É ferido
Se no fundo, nada muda,
Só fica o incômodo
A frustração, a dúvida
A sensação de que algo nisso tudo
Nunca fez – nem fará – sentido?
terça-feira, 14 de julho de 2015
#87
Nunca se havia dado ao luxo
de encher o peito de ar,
pensar em paz,
pensar menos em produzir,
não se forçar a agir
sempre rápido - e antes dos demais;
Quando o fez, ninguém entendeu:
- planos não existem para ser mudados
- ideias não servem de nada sem resultados
- o que você quer fazer da vida?
E tudo em que ela pensava era na dívida
que mantinha consigo mesma
e com seu próprio cansaço.
Sempre que tentou parar um segundo
disseram-lhe que andava indecisa,
que algumas prioridades são dignas,
outras, sinais de descaso
e de projetos inconsistentes;
Um dia percebeu: roubaram-lhe o tempo
e o espaço,
não deram nenhuma margem para o acaso;
percebeu sozinha, e à sua maneira,
que a cada dia se tornaria menos gente,
que estar feliz viraria algo intermitente;
mas chegou a hora de jogar tudo pro alto.
Concluiu: não era perda de tempo
deu-se margem para errar
rever escolhas,
flanar,
achar um jeito próprio de falar de si
de autoconstrução, estar-no-mundo,
de existir;
Ela aprendeu, enfim, a olhar para dentro
e enxergar-se como um projeto,
uma obra aberta
ainda por narrar
e ainda por abrir.
quinta-feira, 12 de março de 2015
Nature
There´s no limit for people
And their pleasure for treason;
If you dig up too much their nature
You see the disharmony of the Real:
People are strange,
Got no mercy,
And if if you look from a certain range
You´ll figure how easy it is
To make people suffer
Using their own weapons.
Even things that seem done for no reason
- They´re predictable
If you insist in understanding
That thing called human behavior
People, nowadays,
They´re in a rage,
And if you burn their bibles,
And rip off their arguments,
And summon their worst desires,
You´ll figure how it is after all:
Everyone seems so full of virtue
´Till worldly needs come and knock
Then you see real people,
Drowning in their hate,
Demanding others´ fate:
A world stably unequal.
It´s no reason to shock:
We're meant to be the same
But since forever
It´s been a game
Of exploitation, self-destruction,
Inescapable delusion
And self-enjoyment
of our endless evil.
quarta-feira, 12 de novembro de 2014
Stiffened
A gente sempre se cria
Como expectativa
Esperança que alimenta
Fica cercado de olhar
Pensa em tudo – meticulosamente
Se reinventa
Percebe que estão à volta,
[presença tensa]
E aí teme desabar
E o medo da gente
Passa a ser o medo do outro:
De uma cobrança que se projeta
Cercando nossos passos;
Apesar de tudo que – teimosamente –
A gente tenta
No fundo, é frágil
A diferença entre o que espera
E o que descobre,
de um jeito amargo e frustrado
A gente é pura incerteza
Pisando em caco de vidro
Deslizando os dedos num corrimão falso
A gente não pode perder a beleza
Só porque se sente perdido
Descobrindo-se vivo num pequeno fracasso
A gente se dói por outra gente
Porque sabe como é estar ferido
E mesmo assim ser fingido no cansaço
Porque sabe que tem que estar erguido
Forte, resistente
Quando tudo o que a gente quer
É dormir uma semana, um mês,
o que dormiria toda a gente:
quando o que a gente quer é afeto em silêncio,
e uma dor em pequenos pedaços.
segunda-feira, 21 de abril de 2014
Mind drive
Do we need to enlighten slowly
Just to get in someone's dirty arms
Lose all grips while roaming
Unconnected, but glowing
This is real life's only glory:
To be forced - to hate yourself
Though you dont know exactly who you are
May seem pretensious but it's no reason to worry
All these people don't deserve each other
With their ran-out-of-time minds, all in disorder
They're all connected, but never evolving
This is real-time untold story
No one's justice will save them from themselves
This is madness
And i'll try
Not to drift in the senseless
Mind drive
She needed to defy herself strongly
So what about pride? This came down easily
Someone says it's all about not thinking
She's unprotected, though claiming
All is perfect, at least unchanging:
This is real-time decadence
And everyone's pleased to watch it from afar
But me
This is emptiness
And i'll hide
I won't look after her in this senseless
Mind drive
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