sábado, 16 de junho de 2007

Limiar


- Hoje eu me senti um século mais velho
deitado ao teu lado, sem um pingo de desejo
Entrelaçando os dedos por entre teus seios,
ouvindo teu bocejo
Como se o amor em mim fosse senil,
inimigo de tão simples deletérios;

- E eu, que nunca havia te sentido tão distante
Senti, tão próximo de mim, em vão segredo
tua face, oculta nas entranhas do medo
como se ainda fosse cedo:
Não tenhas pena de mim, meu amor
é tarde demais para revelar-me jovem;

- És, em mim, reflexo dos mesmos anseios
quando pareci cansado, dei-me forças e, imune
Ao teu ardor, lutei, impune
contra as mesmas incertezas...
Acordei suado, meu amor,
de sangue dos meus lábios e lágrimas tuas.

- Vê? Este corpo que renegas neste instante
sentiste gozar, ao som das mesmas músicas cruas
Sentindo o cheiro de cachaça exalar por entre as curvas
das noites iguais, turvas, embriagantes
Como se o amor, para nós, fosse razão de vergonha
confesso amigo dos mais tristes romances;

- E o limiar que nos separa do desejo
é o mesmo que separa tua vida do meu simples toque
é a mesma tormenta que faz com que, a cada dia, esqueça
Os prazeres da morte que tanto almejo.

(Inspirado em Memória de Minhas Putas Tristes, do Gabriel García Márquez)

terça-feira, 12 de junho de 2007

Objetividade


Eu sempre me julguei mais esperto que vocês
Com minhas respostas prontas e bobagens inteligentes
Tais quais cusparadas de mais um jovem demente
Inconsequente, que nada sabe dos outros ou de si

Dentro destes versos, há uma falácia fútil
Criei entrelinhas para que ninguém pudesse lê-las;
Que pretensão!
Logo eu, que mal sei ler o mundo diante de meus olhos
Querendo ter colhões para lhes destilar o ódio
Em palavras difíceis e vagos devaneios

Tão fáceis de seguir,
Fosse o acaso, ao momento, próprio.

Mas eu desvelo o que há de belo no aleatório
Nas mesmas críticas óbvias e detalhes irrelevantes
Que, de tão repetidos em rimas pobres e irritantes
Já me fizeram ter certo prazer em ser prolixo.

Dentro deste homem, há desilusão com a sintaxe
Perdi as rédeas do que há de humano em mim;
Dei as costas para as velhas metalinguagens!
Logo eu, que me julgava pronto para renegar tudo e todos
Parte do mundo que revira o estômago de poucos
E dá sentido à popular felicidade:

Aprendi que, se quero me sentir vivo, preciso, sim
Renegar a mãe dos loucos: subjetividade.

(Poesia derrotista?)