terça-feira, 14 de julho de 2015

#87



Nunca se havia dado ao luxo
de encher o peito de ar,
pensar em paz,
pensar menos em produzir,
não se forçar a agir
sempre rápido - e antes dos demais;

Quando o fez, ninguém entendeu:
- planos não existem para ser mudados
- ideias não servem de nada sem resultados
- o que você quer fazer da vida?
E tudo em que ela pensava era na dívida
que mantinha consigo mesma
e com seu próprio cansaço.

Sempre que tentou parar um segundo
disseram-lhe que andava indecisa,
que algumas prioridades são dignas,
outras, sinais de descaso
e de projetos inconsistentes;

Um dia percebeu: roubaram-lhe o tempo
e o espaço,
não deram nenhuma margem para o acaso;
percebeu sozinha, e à sua maneira,
que a cada dia se tornaria menos gente,
que estar feliz viraria algo intermitente;
mas chegou a hora de jogar tudo pro alto.

Concluiu: não era perda de tempo
deu-se margem para errar
rever escolhas,
flanar,
achar um jeito próprio de falar de si
de autoconstrução, estar-no-mundo,
de existir;

Ela aprendeu, enfim, a olhar para dentro
e enxergar-se como um projeto,
uma obra aberta
ainda por narrar
e ainda por abrir.